Brasil é condenado em corte internacional por desaparecimento de trabalhador rural da Paraíba

Almir Muniz, trabalhador rural que nunca foi encontrado. Foto: Reprodução TV Cabo Branco. Assassinato de Almir Muniz, trabalhador rural, aconteceu no final dos anos 1990 | Foto: Reprodução/TV Cabo Branco

A Corte Interamericana de Direitos Humanos responsabilizou o Brasil pelo desaparecimento forçado do trabalhador rural Almir Muniz da Silva. Atuante na luta por terra e contra a violência no campo na Paraíba, Almir denunciou milícias rurais antes de desaparecer em 2002. O anúncio da condenação foi feito na tarde desta terça-feira (11).

LEIA MAIS: Como foi o julgamento do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos

Em nota, a Advocacia-Geral da União (AGU) informou que o Estado brasileiro foi notificado da decisão no mesmo dia. O órgão declarou que elaborará um parecer para que as autoridades competentes tomem ciência da sentença e iniciem o cumprimento das determinações.

Almir Muniz da Silva foi visto pela última vez em uma estrada entre as Fazendas Veneza e Tanques, no município de Itabaiana. Contudo, nenhuma denúncia foi formalizada na época, e não houve ações imediatas para sua localização ou investigação do caso. Em 2009, o processo foi arquivado, deixando sua família sem respostas.

Decisão da Corte

O tribunal determinou que o Brasil reabra as investigações sobre o desaparecimento de Almir Muniz da Silva, retome as buscas e forneça assistência médica, psicológica e psiquiátrica às vítimas. Além disso, ordenou a publicação da sentença em diários oficiais e nas redes sociais de órgãos públicos.

Entre as obrigações impostas, o país deverá realizar um ato público de reconhecimento de sua responsabilidade internacional, além de emitir um pedido oficial de desculpas. A decisão também exige que o Brasil ajuste sua legislação para incluir o crime de desaparecimento forçado, desenvolva um protocolo para busca e investigação de pessoas desaparecidas e pague indenizações por danos morais, além do reembolso de custos e despesas aos familiares do trabalhador rural.

Caso Almir Muniz

O crime aconteceu em 2002, quando ele desapareceu em Itabaiana, no Agreste paraibano. Almir Muniz era trabalhador rural, posseiro da Fazenda Tanques, no Município de Itabaiana. No final dos anos 90, ele com mais 30 famílias foram proibidos de plantar nas terras que ocupavam e eram ameaçados de ser expulsos.

No dia 20 de junho de 2002, por volta das 5 horas da manhã, foi chamado por outro agricultor para rebocar o seu carro com o trator da comunidade até uma oficina, na cidade e fez o serviço, porém, ao retornar aproximadamente as 7h20 horas, desapareceu no trecho das proximidades da sede da fazenda.

As investigações foram arquivadas sete anos depois, apesar de indícios de seu assassinato ter sido cometido pelo policial civil Sergio de Souza Azevedo.

Na Corte Interamericana de Direitos Humanos, o Estado brasileiro reconheceu a culpa por falhas na investigação do desaparecimento do trabalhador rural, mas não admitiu que ele foi vítima de um “desaparecimento forçado”, causado por um policial civil.

A Advocacia-Geral da União (AGU) reconheceu a falha na investigação do caso e pediu desculpas por causar sofrimento psicológico e moral aos familiares da vítima. Porém, afirmou que o desaparecimento de Almir Muniz não configura um “desaparecimento forçado”.

De acordo com o órgão, para configurar um desaparecimento forçado, o crime deveria ser caracterizado por privação de liberdade e ser provocado por agente de estado ou por concordância deste. Os dois pontos foram negados pela AGU, que também afirmou que não houve um julgamento formal do suspeito, que era um agente policial, por causa das falhas na investigação, por isso não poderia confirmar a relação do crime com um agente do estado.

Já a Justiça Global defendeu que o caso é caracterizado como um desaparecimento forçado e destacou que o crime não é tipificado pela legislação brasileira, o que implicaria um prejuízo, causando apagamento do fenômeno e violando obrigações internacionais.